Igreja e Sociedade:
assembleia dos que
creem e transformação interior
Uma forma de descobrir a idade de alguém é utilizando marco temporal. Exemplo: alguém que frequentou curso de datilografia, que usa expressões como “a ficha caiu” ou “vire o disco” quando a conversa está chata, seguramente, essa pessoa pertence a outro século. Ora, a Igreja é uma senhora bimilenar. Possui mais de 20 séculos. Para compreendê-la, é preciso adentrar seu jogo de linguagem. Se uma criança perguntasse o que é a Igreja, seguramente esperava uma resposta dentro do “jogo de linguagem” compreensível à criança. Um arquiteto, perguntado sobre tal questão, responderia: Igreja é um templo arquitetônico com características cambiantes (barroco, gótico, moderno, romântico) no curso da história.
Jesus, que era homem, judeu e messias, viveu sua experiência de Igreja dentro do jogo de linguagem da religião judaica. A sinagoga era qualquer lugar (seguramente também à sombra de uma árvore) onde se podia ler a Torah, lei judaica, e interpretá-la. Por isso Jesus frequentava a sinagoga. Surpreendeu a todos quando, ao ler o profeta Isaias, fez da sua homilia uma identidade existencial (cf. Lc 4,15-19). Os primeiros cristãos, na esteira de Jesus, se compreendiam como ekklesia, quer dizer, como assembleia (conceito político) que se reunia para celebrar os mistérios da salvação (conceito religioso, mistério pascal). Essa foi uma primeira contribuição da Igreja à sociedade: deslocar conceitos civis e sacraliza-los numa perspectiva litúrgico-salvífica. Com o passar dos anos, precisamente na Idade Média, a Igreja se compreendeu como instituição romana dotada de hierarquia. Ser igreja não significava mais pertencer somente à assembleia, mas identificar-se com os membros do clero: papa, bispos e padres (com algum aceno á vida religiosa consagrada). Mesmo institucionalizada, a Igreja conseguiu forjar uma forma cabal de contribuir com a sociedade. Nela e a partir dela surge um Aurélio (354-430) Agostinho que, com suas confissões, influencia todo o modo de pensar ocidental, especialmente com o conceito de interioridade e exterioridade. Converteu-se em 387 e escreveu as confissões, provavelmente, 8 anos depois. Mas a mesma Igreja deu á humanidade a figura de Francisco de Assis (1182-1226), jovem rico, que larga tudo, funda uma ordem da qual é expulso para viver a pobreza de propagar a paz. Vai, inclusive, às terras mulçumanas, conversar com o Sultão a fim de que sejam evitadas as guerras. Trava amizade e cordialidade com islamismo que lhe rende, até hoje, a presença franciscana em terras islâmicas. No diálogo e interação com a sociedade, a Igreja também contribui com a cultura biológica, oferecendo as primeiras pesquisas em genética, através do padre jesuíta, Gregor Mendel. À dimensão midiática, veio da igreja os primeiros estudos da produção do rádio feito pelo padre gaúcho Roberto Lendell de Moura.
A Igreja, no seio dos dias atuais, vem se renovando com a presença encantadora do papa Francisco. Homem encorajado pela cultura do encontro e pela noção de uma Igreja em saída. Teve a coragem de pedir aos bispos, em julho de 2013, durante a Jornada Mundial da Juventude, na Catedral da Cidade Maravilhosa, que preferia uma igreja ferida por ter saído do que uma igreja saudável entre os muros e paredes internas. O espírito do papa Francisco continua na mente de todos quantos pensam uma Igreja missionária, que chega às periferias existenciais. Isso porque é fácil ser cristão dentro dos templos. Todos falam a mesma língua, fazem sinal da cruz, rezam as ave-marias. Difícil é ser cristão celebrando fora das paredes, sob o sol aquecido, ou à luz da lua numa noite estrelada. Ou ainda, para usar a terminologia curitibana, banhados pelas nuvens cinzentas e no frio. Quem sabe assim alguém abre o guarda-chuva para acolher os que penam nas águas sem teto, ou os desagasalhados no frio que desejam os cobertores dos que rezam. Bem que podia ser de um cristão o texto do educador brasileiro Cristóvão Buarque que, perguntado a respeito da internacionalização da Amazônia, responde que seria a favor – desde que se internacionalizasse o petróleo, patrimônio mundial, as produções culturais da humanidade dos grandes museus europeus, ou as crianças que poderiam estudar quando são obrigadas a trabalhar, ou ainda, as crianças que morrem quando deveriam viver. Um bom cristão, assemelhado a Jesus, vive dentro e fora do templo numa relação amorosa. Chama Deus de Abbá, paizinho, para, erguendo os olhos no palco do mundo, louvar, bendizer e testemunhar a Vida. Vida em plenitude... como queria e vivia o messias, salvador, filho de Deus.
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sivalsoares.com abril 2015
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